Parte 6 – Atividade iluminada#
A atividade é beneficiar seres de modo não conceitual.
Capítulo 21 – Ensinamento sobre a atividade iluminada de budas#
Em relação a esse ponto (“a atividade é beneficiar seres de modo não conceitual”), poderia ser imaginado:
— Já que todas as aspirações — gerar a mente do despertar no início, praticar o caminho no meio e realizar a budeidade no final — são exclusivamente para remover o sofrimento e efetivar o bem de seres, e já que não há conceitos nem esforço no estágio da budeidade, vai mesmo surgir algum benefício para seres sencientes?
Sim. Ao mesmo tempo em que budas não abrigam conceitos nem precisam se esforçar, o benefício para seres migrantes surge espontaneamente e sem interrupção. O resumo da explicação sobre como isso ocorre é:
Corpos iluminados atuam pelo bem de seres migrantes de modo não conceitual, assim como
a fala e mente iluminadas atuam pelo bem
de seres migrantes de modo não conceitual.
A atividade iluminada de budas
se resume nesses três pontos (corpo, fala e mente).
Sobre isso, o Sublime Contínuo exemplifica como é a atividade não conceitual de corpo, fala e mente pelo bem de seres:
O Tathagata é como Indra, o tambor divino
e nuvens; é como Brahma, o sol, a joia preciosa
(que realiza desejos), ecos, o espaço e a terra.
Sobre essa passagem, “a manifestação de Indra” é uma analogia para a atividade do corpo iluminado que beneficia seres de modo não conceitual.
Nesse exemplo, essa poderosa divindade Indra possui uma assembleia de consortes em seu palácio Vijaya, que é feito de esmeralda azul1, cujo resplendor reflete a imagem de Indra para muito além do palácio. Ao verem os reflexos de Indra e suas riquezas, homens e mulheres vivendo na terra fazem a aspiração: “Que eu também possa rapidamente me tornar assim!” Para isso, se esforçam na virtude e renascem ali após a transferência da morte. A manifestação desses reflexos ocorre sem nenhum conceito ou ação (por parte de Indra).
De modo similar, pessoas que se engajam completamente no grande propósito, ao se familiarizarem com a fé e tudo mais, veem os corpos de budas perfeitos, ornamentados com as marcas e sinais, andando, de pé, sentados, dormindo, ensinando o Dharma, meditando e tudo mais, demonstrando cada um de seus milagres. Essas aparências geram fé e aspiração. Para chegar a essa realização, elas se engajam nas causas disso: o cultivo da mente do despertar etc. E realizam a budeidade no final. Essa manifestação na forma de corpos iluminados ocorre sem nenhum conceito ou ação intencional. Sobre isso, é dito (no Sublime Contínuo):
Assim como o reflexo do corpo da majestade divina
se manifesta na límpida superfície da esmeralda azul,
do mesmo modo, surge o reflexo do corpo iluminado
do Poderoso Sábio na límpida superfície
da mente de seres.
Desse modo, o corpo iluminado não conceitual atua pelo bem de seres migrantes.
O “tambor divino” é uma analogia sobre como a atividade iluminada da fala beneficia seres migrantes de modo não conceitual. Nesse exemplo, no palácio divino Vijaya, há o chamado “tambor divino que detêm a habilidade do Dharma”. Sua existência se deve ao poder das ações virtuosas prévias dessas divindades. Ele emite sons de modo completamente não conceitual, como este: “Todas as coisas compostas são impermanentes!” Isso incita as divindades imprudentes. Sobre isso, é ensinado (no Sublime Contínuo):
Entre divindades, através do poder
de suas ações prévias, o tambor do Dharma incita
continuamente todas elas com sons como
“paz”, “impermanência”, “sofrimento”
e “ausência de identidade2”, de modo completamente
não conceitual, sem esforço, localidade,
mente ou forma.
De modo similar, a fala de budas expõe o Dharma da maneira que for apropriada para quem possui essa fortuna, sem esforço ou deliberação, assim como é dito (no mesmo texto):
Do mesmo modo, a soberana natureza onipresente,
livre de qualquer esforço, alcança
seres migrantes sem exceção,
como a pervasiva fala do Buda
que revela o Dharma para pessoas afortunadas.
Desse modo, a fala iluminada não conceitual atua pelo bem de seres migrantes.
A expressão “como nuvens” é uma analogia sobre como a atividade iluminada da mente beneficia seres migrantes de modo não conceitual. Nesse exemplo, nuvens se juntam no céu sem nenhum esforço durante o verão e derramam chuva sobre a terra de modo não intencional, dando nascimento a colheitas e todas as demais prosperidades. Sobre isso, é ensinado (no Sublime Contínuo):
Assim como nuvens durante o verão
causam a abundância das colheitas,
despejando intensamente muita água na terra
sem nenhum esforço, ...
De modo similar, a atividade da mente iluminada não conceitual derrama a chuva do Dharma nas pessoas a serem treinadas, amadurecendo a colheita da virtude, assim como é ensinado (no mesmo texto):
… desse mesmo modo, as nuvens da compaixão
derramam a chuva do Dharma sagrado dos Vitoriosos
para a contínua colheita do bem de seres migrantes,
de forma completamente não conceitual.
Assim, a mente iluminada não conceitual atua pelo bem de seres migrantes.
Sobre o exemplo “como Brahma”, a majestade divina Brahma manifesta sua presença em todos os reinos divinos, ao mesmo tempo em que não sai de sua morada. De modo similar, o Buda beneficia emanando atividades como os 12 atos e tudo mais para pessoas a serem treinadas, ao mesmo tempo em que jamais se move do dharmakaya. Sobre isso, é ensinado (no Sublime Contínuo):
Assim como Brahma se manifesta
sem esforço em todos reinos divinos
sem deixar sua morada, o Sábio revela
sem esforço emanações para as pessoas com mérito
em todos os lugares, sem deixar o dharmakaya.
Sobre o exemplo “como o sol”, os raios de luz solar fazem desabrochar flores de lótus e incontáveis outros tipos, simultaneamente e sem deliberação. De modo similar, os raios de luz de budas fazem desabrochar em direção à virtude o lótus na mente de pessoas em treinamento, em suas incontáveis disposições e aspirações, de modo não conceitual e sem esforço. Sobre isso, é dito (no Sublime Contínuo):
Assim como o sol emana seus raios de luz,
de modo simultâneo e sem deliberação,
causando o florescimento de lótus
e amadurecendo outras flores,
o Tathagata engaja os raios solares
do Dharma sagrado
no lótus das pessoas a serem treinadas,
de modo completamente não conceitual.
Outra forma de explicar essa analogia é: assim como os reflexos do sol surgem ao mesmo tempo em todos recipientes com água límpida, o Buda aparece simultaneamente para todas as pessoas em treinamento que percebem aparências puras devido à purificação. Nesse sentido, é ensinado (no mesmo texto):
Os incontáveis reflexos solares do Tathagata
brilham simultaneamente em todos recipientes
com a água purificada das pessoas em treinamento.
Sobre o exemplo da “joia que realiza desejos”, assim como essa joia não tem conceitos nem se esforça ao dar surgimento às necessidades que são suplicadas a ela, as diversas intenções de shravakas e outras praticantes que se devotam a budas são realizadas. Sobre isso, é dito (no Sublime Contínuo):
Assim como a joia dos desejos realiza
cada um dos pedidos das pessoas
em seu domínio, imediatamente e sem pensar,
ao reverenciar o Buda que atende aspirações,
diferentes ensinamentos são ouvidos
por quem tem diferentes intenções.Ele faz isso sem nenhuma deliberação.
Do mesmo modo, as analogias sobre “ecos, espaço e terra” também demonstram a atividade de beneficiar seres migrantes de modo não conceitual.
Este foi o “Capítulo 21 – Ensinamento sobre a atividade iluminada de budas”, do Ornamento da Liberação Preciosa, o Dharma Sagrado que é Como Uma Joia que Realiza Desejos.
Aqui termina esta explicação gradual do caminho Mahayana, solicitada e transcrita pelo monge Dharma Khyab, composta pelo médico Sonam Rintchen, chamada Ornamento da Liberação Preciosa, o Dharma Sagrado que é Como Uma Joia que Realiza Desejos.
Assim como o benefício para seres migrantes
que surge de modo não conceitual,
a partir do Dharma sagrado que é
como uma joia dos desejos,
através do mérito de sua transcrição,
que todos os seres realizem a sublime iluminação!Haja virtude!
1 Essa joia (sânsc.: vaidurya) também se refere a uma pedra preciosa mágica de reinos divinos na mitologia indiana.
2 Nota do original tibetano: Os Preceitos dos Quatro Selos são: todas as coisas compostas são impermanentes, todos os fenômenos não têm identidade, todas as coisas contaminadas são sofrimento, toda transcendência do sofrimento é paz (esses “quatro selos” resumem o ensinamento do Buda).